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9 de agosto de 2018

A banca está de portas fechadas






Nos últimos dois anos, todos os dias, antes de entrar no trabalho, passo em frente à banca do Setor de Autarquias Sul, aquela entre o Banco Central e a Matriz da CAIXA Econômica. As vezes entro para folhear uma revista, comprar um doce, beber água, encher saco do dono. A banca já me serviu de abrigo em meio a tempestade, foi ponto de taxi, local para fazer uma boquinha. Tem picolé, sorvete, refrigerante, revistas, sucos, energético, cigarro, ceda, pipoca, biscoito e até uma barraca de Tapioca do lado de trás. Aviso que para comer da tapioca tem que levantar cedo, só funciona até às 10h da manhã, mas deve ser uma delícia, pois vive cheia.

Nesses últimos dias o movimento maior tem sido para trocar figurinhas da copa. É menino, adulto, velho, todos na busca de completar o álbum da copa. O dono sempre de olho para não levar um filão.

Ali se fala de futebol, segurança, política. Aliás quando o Lula foi preso se armou uma confusão do lado de fora entre dois entendedores do assunto. Eu, como a maioria dos executivos do setor de Autarquias, estava atrasado e não fiquei para ver o desenrolar da história. Mas não deve ter dado em morte, afinal a banca é bastante segura, sempre tem no mínimo cinco policiais pela manhã.

Em meio a tudo, algumas obras clássicas aparecem em versão de bolso. A coleção de livros L&PM Pocket com os grandes clássicos está na prateleira a tanto tempo que as páginas das obras de Nietzsche, Kafka, Bukowski, Machado de Assis, Clarice Lispector e Oscar Wilde estão amareladas. Particularmente, acho o preço salgado para livros de bolso. Deve ser por isso que estão lá tanto tempo.

Mas o fato curioso aconteceu hoje. Em plena quinta-feira (08) a banca não abriu. Detalhe exclusivo nesses dois anos para um dia de semana. Digo até preocupante. Nem durante a reforma ela fechou. O detalhe aguçou a minha curiosidade e de alguns frequentadores. “Fechada? Será que morreu?” perguntou o senhor que vinha do Banco Central. “Deve ter morrido!”, respondeu o flanelinha. Um cliente esperava sentado na porta. “Deve abrir daqui a pouco!”, resmungou o esperançoso. “Ixa, tá fechada?”, lamentou a moça com o crachá da CAIXA.


O assunto do dia não é a Petrobrás, não é Lula, não é o aborto na Argentina. O assunto do dia, ao menos por aqui, é a banca não ter aberto as portas hoje. Agora só nos resta esperar até amanhã para perguntar ao dono por que a banca não abriu. 

Conheça mais trabalhos de André de Castro

6 de junho de 2018

Vou te contar uma história



Ele desperdiçou muitas oportunidades e procura emoções nos lugares errados.

Ele entrou em uma briga feia com homens muito malvados.

Ela era bonita. Esse era o motivo.

Ele pode não ter futuro, mas tem um passado e tanto.

Mas ela não durou nada, como eu pensei que duraria.

31 de janeiro de 2017

Experimente fazer o bem

Por André de Castro


Fiquei muito tocado ao me deparar com a frase: “Deus nunca a abandonou. Quem abandonou o próximo fomos nós”, disse o produtor musical brasileiro, Alok, em depoimento, durante visita à Moçambique para conhecer o projeto social da instituição “Fraternidade Sem Fronteiras”.

A frase foi dita ao se deparar com a realidade e tamanha pobreza daquele país. O rapaz conheceu uma senhora de 98 anos que era mantida pela fé, durante toda sua vida, pois alimento nem sempre tinha. Naquele momento a senhora de lenço na cabeça usava uma camiseta amarrada na altura da barriga, para pressionar o estômago e assim não sentir tanta fome, apesar de já estar a três dias sem se comer.

Além da senhora que era alimentada pela fé, o documentário traz a figura típica daquele lugar, como o garoto catarrento e órfão, portador de HIV. Somente em Moçambique existem cerca de um milhão deles, sujo de lama e amontoado no lixo. Aliás, lama é o que se vê em todo lugar: chão de barro, parede de barro, teto de barro, casa de barro, bolinho de barro pra comer. Gente que vive simplesmente para sobreviver.



Deus abandonou eles? Seria o pagamento de uma dívida de vidas passadas? Estão sendo castigados? Respostas que não podem ser respondidas. 

Mas como pode, crianças inocentes pagando por penas tão severas que nem criminoso cruel pagaria em cela fechada.

É difícil ver a lágrima escorrendo do olho de uma senhora, que um dia foi criança, e envelheceu sem ter esperança de ter se quer dignidade.

É triste falar de tal assunto. É desagradável. Mas deve ser dito. São problemas que devem ser combatidos. Cada um a seu modo. Não é possível uma única pessoa mudar o mundo, mas é possível mudar aquilo que está ao nosso alcance.

A “Fraternidade Sem Fronteiras” é uma instituição que nasceu no Brasil e trabalha no amparo à essas pessoas. Você pode apadrinhar uma criança por meio desta instituição. Ela atua no acolhimento de órfãos em lugares aterrorizados pela pobreza, falta de comida, higiene e educação. Entretanto essa é somente uma forma de se doar ao próximo. De tentar fazer algo por alguém sem exigir algo em troca. 

Mas você pode inventar a sua própria forma de fazer o bem para alguém e assim fazer bem a si mesmo. 

Experimente!



Para conhecer o trabalho da instituição citada no texto: 


Para ver o vídeo documentário citado:

27 de janeiro de 2017

O Patriota

Por André de Castro
Era brasileiro. Mas não gostava de futebol, novela, feijoada ou cerveja. Se trancava em casa no carnaval, odiava caipirinha e, mais ainda, gente que fazia uso de tal bebida. Roberto Carlos, Pelé; "isso não é rei" dizia ele “isso é apenas invenção da mídia”. Nunca leu Machado de Assis ou Euclides da Cunha, acreditava que Santos Dumont só fez o que deveria ter feito, "se não fosse ele, logo os americanos inventaria esse troço", dizia.

Não gosta de samba, menos ainda de sertanejo. Quando foi ao Rio de Janeiro, não viu graça no Cristo Redentor ou no corcovado. Julgou vulgar as lindas mulatas quase nuas que viu no calçadão de Ipanema. Saiu de lá dizendo que aquilo nem de longe era uma cidade maravilhosa. Não gostava do Lula, não gostava de cachaça, odiava novela. Não ligava a TV aos domingos, não passeava com o cachorro, nunca namorou no portão. Quem ouve não acredita, mas ele morreu dizendo que era patriota.

26 de janeiro de 2017

Divago


Passarinhos não percorrem pelo espaço enquanto a chuva cai. Mas enfestam a minha cozinha nas tardes de sol e me fazem crer que sou um porco por derramar tanto arroz no piso bege. Eles são apenas pássaros. E eu sou apenas um porco.

15 de agosto de 2016

Nunca diga nunca

Por André de Castro


O Pachequinho, filho de seu Pacheco e da dona Gertrudes, separados há anos, vivia contrariado em ter que passar um final de semana na casa de um e de outro. A raiva era tanta que Pachequinho nem se quer dava bola pra namoradinha ou coisa do tipo. Conheceu Dalila no primeiro dia de aula, já na faculdade. Começaram a namorar. Na primeira avançada de pachequinho, a garota de família tradicional, deixou bem claro: "essas coisas só depois de anel no dedo e papel passado". Após seis meses, dona Gertrudes não entendeu nada. O padre se dirigiu a Pachequinho e disse: "pode beijar a noiva".

Pedro Lucas, "o correto", criticava a burocracia e o funcionalismo público: "jamais vou mamar na teta do governo", dizia. Chegou a ser sócio de uma empresa de roupas que faliu. Hoje está cheio de olheiras. Passa noites em claro, estudando lei orgânica, lógica e redação. Tem meses que viaja pra outros estados pra fazer provas.

A então menina Lorena, em tempos de faculdade, queria mudar o mundo. Hoje, mulher, só quer um emprego.

Gabriel, filho do garí, seu Zé, já se conformava em seguir a profissão do pai. Semana passada, seu zé chorou no aeroporto, ao se despedir do filho. Após a residencia, Gabriel foi agraciado com uma bolsa pra se especializar em medicina na França.

Seu Francisco Mota, dono da mercearia, tinha tantos problemas de saúde aos 40, acreditava não chegar aos 50. Já na casa dos 80, resolveu fazer uma ultima batida de exames. O médico disse que seu Francisco tem a saúde de um touro.

A vida tem dessas coisas.

4 de julho de 2016

Alçando voo








Eu sou o piloto
dessa nave chamada vida
Nada pode dar errado, 
pois,
tenho o melhor copiloto do mundo
ao meu lado.
O nome dele é Deus.

15 de julho de 2015

Seu maior problema é você

Por André de Castro

Se tem algo que nos persegue a vida toda são os problemas. Estamos sempre cheios deles. Vai um vem outro. É algo que atinge todos, sem restrições. Do mais rico ao mais pobre, do mais novo ao mais velho. O poeta Paulo Leminski já afirmava em seu poema que problemas não se resolvem. Segundo o autor, problemas têm família grande e aos domingos saem o todos a passear, o problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas. Na segunda os probleminhas já estão maiores e o problemão já está a ponto de nos infernizar a semana toda. Teremos sempre que conviver com eles, dormir com eles, acordar com eles. Não adianta tentar arrancar na força. Problema se trata com jeitinho.

O provérbio chinês afirma que um problema que não tem solução já é um problema resolvido. Benjamin Franklin disse que viver é enfrentar um problema atrás do outro. Descartes falou que não existem métodos fáceis para resolver problemas difíceis. Quem abandona os seus são os fracassados, covardes. Não estou dizendo aqui pra você deixar de resolver os seus. Cada um que carregue a sua cruz. O fato é que algumas pessoas vivem somente em função deles. Esquecem de viver. Eles precisam sim serem resolvidos, o quanto antes melhor. Por mais que você pense não haver mais solução é preciso continuar tentando, entretanto é preciso viver também.

Comece arrumando as coisas mais simples e vai ver que aos poucos a vida vai se arrumando. Tem gente que passam a vida toda se preocupando com os grandes problemas, quando na realidade um grande problema é a junção de vários pequenos probleminhas. Comece pelo seu guarda roupas, quarto, casa. Não é possível ter uma vida organizada quando não se arruma tempo pra cortar suas unhas do pé, o cabelo, lavar a louça.

Você já se perguntou quem é a pessoa mais importante do mundo? Eu tenho a resposta. A pessoa mais importante do mundo é você. Com o tempo a gente vai percebendo que a maioria dos problemas de nossa vida ocorrem por que a gente não cuida da gente mesmo. Seu maior problema é você. A pessoa passa tanto tempo cuidando dos outros, dos problemas dos outros, das coisas dos outros, da vida dos outros e esquece do si. Somente estando bem vai poder fazer bem aos que estão à sua volta, aos que se gosta. Quanto tempo você não vai ao dentista ou faz uma consulta médica? Há quanto não compra um sapato novo ou tira uns dias pra viajar? É preciso cuidar da sua vida como se ela fosse realmente sua. Coloque você na sua agenda como algo realmente importante.

Geralmente se anda tanto pra nada. Pregue uma peça na rotina de vez em quando, fuja um pouco da correria. É preferível dar um único passo certo ao correr a vida toda e não chegar a canto algum. As vezes é preciso parar e refletir se está caminhando na direção correta. Seu dia não precisa ser a mil por hora. Durma pesado e tenha um dia mais leve. O progresso depende de energia, energia implica descanso, renovação. Muitas vezes é preciso buscar a cura da alma. Não importe sua crença, o que importa é ter no que acreditar. Pergunte a si mesmo o que realmente é importante na sua vida. O que faz sentido pra você. A vida precisa ter direcionamento. Shakespeare já dizia: “se você não sabe pra onde vai, qualquer lugar serve”. E não existe lugar pior que qualquer lugar.

O tempo passa, os problemas nunca se acabam. Acabamos de resolver um e o outro já está batendo à porta. Quando se viu já sé foram trinta, quarenta, cinquenta, oitenta anos. Você pode escolher o que fazer: passar a vida toda resolvendo problemas ou passar a vida toda resolvendo problemas e vivendo também. Não deixe de resolvê-los. Mas não se esqueça de viver.

Um abraço

17 de junho de 2015

Eu sei, mas não devia


O texto de hoje é uma homenagem a escritora Marina Colasanti. Foi publicado no livro "Eu sei, mas não devia", em 1996. A reflexão continua atual e importante. Sugiro aos leitores deste blog que  procurem por outras obras dessa fantástica autora.
Caricatura de Marina Colasanti feita pelo artista Rocha para o livro "E por falar em Marina".

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.